A Patopsicologia, de acordo com a perspectiva de Bluma Zeigarnik, é um campo de estudo da psicologia que se concentra na compreensão das disfunções mentais e das perturbações emocionais que afetam a mente humana.
Bluma Zeigarnik, uma psicóloga e psiquiatra russa, ganhou destaque ao explorar profundamente as causas e consequências dos “problemas psicológicos”, deixando um legado significativo no âmbito da saúde mental.
A patopsicologia se atém à importância da atividade na formação do psiquismo, destacando sua estrutura hierárquica, especialmente as necessidade e motivos e a complexa relação de mediação que o constitui.
O que é a Patopsicologia?
A patopsicologia formulada por Zeigarnik baseia-se na concepção de Leontiev, que enfatiza a significância da atividade na formação do psiquismo. Ela destaca a estrutura hierárquica desse processo, especialmente as necessidades e motivações, bem como a complexa rede de mediação que o compõe.
De acordo com Boris Sergeevich Bratus, que também se apoia nesse mesmo pressuposto defendido por Vygotsky, os mecanismos psicológicos são idênticos para o desenvolvimento tanto normal quanto patológico, mas operam em contextos distintos, resultando em diferenças qualitativas e, à primeira vista, em produtos finais aparentemente incompatíveis, alinhando-se, assim, com a abordagem patopsicológica desenvolvida por Zeigarnik.
“A estrutura hierárquica dos motivos é relativamente estável, isto é, fundamenta a relativa estabilidade de toda a personalidade, seus interesses, pontos de vista e valores. O material patológico permite estabelecer as leis de modificação da esfera motivacional do homem, as quais conduzem a alteração dos pontos de vista, interesses e valores da personalidade.”
Bluma Zeigarnik
A patopsicologia, em seu contexto, se concentra em investigar como a mente humana lida com a patologia, ou seja, com estados de doença mental e distúrbios psicológicos, especialmente em relação à memória e ao funcionamento cognitivo das pessoas afetadas por esses problemas
Segundo Zeigarnik, qualquer modificação na atividade mental exerce influência sobre a dinâmica da personalidade – como no caso da neurose –, requerendo uma análise minuciosa para identificar as particularidades psicológicas que sofreram alterações.
A autora destaca que a enfermidade cria condições especiais que afetam o desenvolvimento dos processos psicológicos. Esses processos, por sua vez, resultam em uma percepção distorcida da realidade e, como consequência, na formação e fortalecimento de uma atitude alterada em relação ao mundo, culminando na manifestação de traços patológicos na personalidade.
Patopsicologia e a clínica psicológica
A patopsicologia se dedica à investigação dos processos que levam à desintegração do psiquismo, que se manifesta de forma não conformista. Essa desintegração envolve uma série de mudanças, incluindo alterações na formação da personalidade, o surgimento de necessidades e motivações patológicas, mudanças na hierarquia dessas motivações e também transformações nas formas de percepção, memorização, pensamento e na construção de significados, entre outros aspectos.
Ou seja, a autora argumenta que a função do psicólogo consiste em, a partir dos dados descritivos fornecidos pela medicina (tais como sintomatologia, tempo de manifestação e histórico), identificar como a personalidade, os motivos e as necessidades foram alterados.
“Traços de personalidade são formados em uma pessoa saudável e em uma pessoa doente pelas mesmas leis, mas as condições, tanto sociais quanto biológicas, mudam. A tese de S. L. Rubinshtein está sendo implementada, que as causas externas operam através de condições internas. Precisamente porque os estudos patopsicológicos têm como objetivo investigar não apenas um traço, um invariante, mas o estudo da pessoa como um todo em suas ações, comportamento e comunicação, podem servir como evidência concreta da correção dessa situação. Não é a classificação de pessoas e a alocação de tipos que devem ser direcionadas para o estudo do desenvolvimento da personalidade (doente ou saudável), mas sobre as condições que levaram a uma ou outra estrutura de sua atividade.”
Bluma Zeigarnik
O método experimental da Patopsicologia
As pesquisas patopsicológicas conduzidas por Zeigarnik e sua equipe abordaram condições patológicas por meio de métodos experimentais, uma vez que isso permitia detectar não apenas as estruturas alteradas pelo adoecimento, mas também as formas da atividade psíquica do paciente que permanecem intactas. A necessidade desse enfoque é crucial para abordar questões relacionadas à reabilitação das funções prejudicadas, conforme proposto pela Psicologia Histórico-Cultural.
A autora argumenta que a patopsicologia experimental se baseia no método de pesquisa desenvolvido por Lev Vygotsky relacionado à zona de desenvolvimento proximal. Isso ocorre porque, ao identificar as alterações patológicas e o que ainda está preservado, torna-se possível desenvolver estratégias de intervenção que se concentram nas habilidades latentes dos indivíduos e promovem a reabilitação.
Zeigarnik também argumenta que o método experimental pode ser empregado para fins de diagnóstico diferencial. Isso ocorre porque ele permite a análise dos aspectos estruturais da condição patológica e a identificação do grau de alteração no processo psíquico. Essas são as considerações mais cruciais, embora não sejam as únicas possibilidades.
De acordo com Flavia Gonçalves da Silva, é fundamental compreender como o indivíduo interpretou a tarefa proposta para fins de diagnóstico, o que o motivou a executá-la e quais estruturas foram afetadas ou preservadas durante o processo de adoecimento.
Para alcançar esse objetivo, a autora conduziu uma série de estudos experimentais, conforme detalhados em suas obras, com indivíduos que apresentavam diversos diagnósticos, tais como esquizofrenia, epilepsia, doenças cerebrovasculares, traumas cerebrais, oligofrenia (deficiência intelectual), paralisia progressiva, encefalite, psicopatias e psicose maníaco-depressiva (transtorno bipolar).
O Conceito de Patopsicologia e o “Efeito Zeigarnik”
Bluma Zeigarnik enfatiza que a mente humana é suscetível a diversas perturbações, e entender essas disfunções é essencial para fornecer um tratamento adequado aos indivíduos que sofrem com problemas psicológicos.
A teoria da Patopsicologia, desenvolvida por Zeigarnik, explora os eventos ou experiências que ficam “incompletos” na mente do indivíduo, causando um estado de tensão mental.
Segundo Zeigarnik, quando uma tarefa ou objetivo é interrompido ou não concluído, a mente tende a continuar trabalhando nessa situação de maneira não consciente, gerando um estado de tensão ou desconforto psicológico. Essa tensão é conhecida como “efeito Zeigarnik“. Por exemplo, quando alguém é interrompido enquanto realiza uma tarefa, como resolver um quebra-cabeça ou assistir a uma série, a mente continua focada nessa atividade inconclusa até que ela seja finalizada.
A teoria de Zeigarnik é frequentemente aplicada para entender o comportamento humano, particularmente em situações que envolvem motivação, aprendizado e memória. Além disso, sua abordagem fornece uma visão valiosa para a compreensão dos mecanismos subjacentes às desordens psicológicas e emocionais, dando origem ao que chamamos de Patopsicologia.
Diferenças entre Patopsicologia e Psicopatologia
De acordo com Bluma Zeigarnik, a Patopsicologia e a Psicopatologia são duas perspectivas distintas para estudar os aspectos patológicos da psicologia humana, sendo que ambas têm suas próprias abordagens e enfoques.
Patopsicologia
- Disciplina que busca investigar as alterações das atividades psíquicas de forma qualitativa;
- Opera com conceitos e categorias psicológicas (atividade, motivação-necessidade, personalidade);
- Ocupa-se da caracterização psicológica dos mecanismos da formação das alterações das funções psicológicas superiores e da personalidade;
- Método psicológico-experimental.
Psicopatologia
- Ciência médica baseada na psiquiatria clínica;
- Opera com conceitos clínicos-médicos (etiologia, patogênese, sintoma e síndrome) e critérios patológicos gerais (surgimento e término da enfermidade);
- Ocupa-se da descrição de sinais da enfermidade psíquica, com base em como se apresentam;
- Método clínico-descritivo.
Aplicação da Patopsicologia na Clínica Psicológica
Existem diversas formas de pensar a aplicação da patopsicologia na clínica, especialmente pela Psicologia Histórico-Cultural.
Identificação de Traumas e Experiências Não Resolvidas
Na clínica psicológica, a Patopsicologia de Zeigarnik pode ser usada para identificar traumas e experiências emocionais não resolvidas que podem estar afetando negativamente o bem-estar mental de um indivíduo em suas funções psicológicas superiores. Ao entender quais eventos ou memórias estão causando tensão e perturbação, o psicólogo pode trabalhar com o paciente para abordar esses problemas de forma terapêutica.
Formulação de Estratégias Terapêuticas
Com base na teoria de Zeigarnik, os profissionais da saúde mental podem desenvolver estratégias terapêuticas específicas para ajudar os pacientes a resolverem questões emocionais inacabadas e comportamentos fossilizados.
Prevenção e Promoção da Saúde Mental
A Patopsicologia também desempenha um papel na prevenção, ao abordar situações inacabadas ou traumas antes que se agravem e se transformem em problemas psicológicos mais complexos. Identificar e resolver essas questões em estágios iniciais pode ajudar a evitar o desenvolvimento de transtornos mentais mais graves.
Entendimento dos Mecanismos de Transtornos Mentais
Ao explorar a mente humana através da lente da Patopsicologia, os profissionais podem adquirir uma compreensão mais profunda dos mecanismos por trás de diversos transtornos mentais, tais como transtornos de ansiedade, depressão, transtornos de personalidade, entre outros. Essa compreensão é fundamental para desenvolver abordagens terapêuticas eficazes e oferecer um atendimento mais abrangente aos pacientes.
Patopsicologia e a Psicologia Histórico-Cultural
As ideias de Ziegarnik foram profundamente inspiradas pela teoria criada por Vygotsky e suas bases epistemológicas.
Assim, a Psicologia Histórico-Cultural está bastante conectada com a Patopsicologia. Da maneira como pensamos o tratamento e a investigação dos sintomas à forma como cuidamos da prevenção da saúde mental, uma prática da clínica histórica-cultural passa também pelas reflexões que a patopsicologia nos traz.
Hoje em dia, também podemos notar a influência do conceito da psicologia da corporeidade e como os estudos sobre o inconsciente, a partir da perspectiva histórico-cultural, também ajudam nas intervenções clínicas.
Nesse contexto, a patopsicologia tem o potencial de oferecer uma perspectiva alternativa para a compreensão das condições de doenças mentais, investigando, por exemplo, quais conexões no processo de pensamento foram impactadas durante o adoecimento e de que maneira. A abordagem patopsicológica desenvolvida por Zeigarnik se dedica a examinar minuciosamente esses processos, buscando entender a posição de um fenômeno dentro da estrutura da atividade intelectual.
